Trama golpista: Voto de Cármen Lúcia hoje pode fechar o 'caixão' de Bolsonaro

Por O Globo Quinta-Feira, 11 de Setembro de 2025
Sete dos 11 ministros que fazem parte da atual composição do Supremo Tribunal Federal (STF) já consideraram inconstitucional a hipótese de perdoar condenados por ataques à democracia. A maioria dessas manifestações ocorreu quando a Corte derrubou, em 2023, um indulto do ex-presidente Jair Bolsonaro ao ex-deputado Daniel Silveira, que cumpre pena de oito anos de prisão por ameaça ao Estado Democrático de Direito. Todos os atuais componentes da Primeira Turma do STF, que julga Bolsonaro e outros sete réus por crimes similares, já se posicionaram contra o perdão a atos antidemocráticos.
No julgamento do caso de Silveira, realizado em maio de 2023, os ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Luiz Fux afirmaram de forma explícita que um indulto presidencial não poderia alcançar crimes contra a democracia. Além deles, os ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino também já apresentaram argumentos no mesmo sentido.
Moraes, Cármen, Fux, Zanin e Dino integram atualmente a Primeira Turma da Corte, que analisa a ação da tentativa de golpe contra Bolsonaro — cujos aliados no Congresso buscam aprovar um projeto para anistiar o ex-presidente e outros acusados desse tipo de crime. Caso aprovada, a tendência é que a anistia seja judicializada, o que levaria o Supremo a se debruçar sobre o caso.
Na sessão de anteontem do julgamento da trama golpista, Dino citou que a maioria dos ministros do STF já se posicionou no sentido de que os crimes analisados nesse caso são “insuscetíveis de indulto, anistia, de afastamento ou de extinção da punibilidade”. Um dos posicionamentos lembrados por Dino foi o de Fux, que negou a possibilidade de indulto a Silveira por envolver um ato contra a democracia.
— Entendo que crime contra o Estado Democrático de Direito é um crime político e impassível de anistia, porquanto o Estado Democrático de Direito é uma cláusula pétrea que nem mesmo o Congresso Nacional, por emenda, pode suprimir — afirmou Fux, na ocasião.
Outro posicionamento contrário ao indulto presidencial a Silveira foi o do ministro Dias Toffoli, que abriu a brecha, porém, para que crimes contra a democracia fossem contemplados em uma anistia.
— Os atos, por exemplo, praticados em 8 de janeiro são insuscetíveis de indulto, porque são atentatórios ao Estado Democrático de Direito, à separação de Poderes. Em tese, entendo que poderiam ser objeto de lei de anistia aprovada pelo Parlamento, como já ocorreu no passado em nossa história — avaliou Toffoli.
Um posicionamento similar ao de Toffoli já foi manifestado pelo atual presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso. Em uma palestra no fim de agosto, Barroso criticou as discussões por anistia a Bolsonaro antes mesmo do julgamento da Primeira Turma, mas afirmou que depois de uma eventual condenação pelo STF o tema passa a ser uma “questão política, que vai ser definida pelo Congresso”. O ministro, que vem defendendo a necessidade de “responsabilização de todos que atentem contra a democracia”, já disse também que não deseja “antecipar” uma posição sobre anistia a Bolsonaro, já que o tema pode ser alvo de análise pelo Supremo.
À época do indulto de Silveira, Barroso também votou para derrubar a medida de Bolsonaro, mas não entrou na discussão jurídica sobre o perdão a atos antidemocráticos. Barroso se ateve a outra tese levantada pelos ministros, de que o indulto em questão era um desvio de finalidade, por se tratar de um ato individualizado para beneficiar aliado do então presidente. Posição semelhante foi adotada pelo ministro Edson Fachin.
Os únicos ministros a defenderem o indulto a Silveira à época foram André Mendonça e Kassio Nunes Marques. Ambos argumentaram que, segundo a Constitução, os únicos crimes explicitamente “insuscetíveis de graça ou anistia” são os de tortura, tráfico de drogas, terrorismo e aqueles classificados como hediondos.
Da atual composição do Supremo, Dino e o ministro Cristiano Zanin, hoje presidente da Primeira Turma, não estavam na Corte à época do indulto a Silveira. Na ocasião, Zanin escreveu um artigo no qual argumentou que o ato de Bolsonaro era ilegal por “desrespeitar outro poder da República, passando por cima da independência e da harmonia entre os Poderes”.