Moraes determinou prisão de Bolsonaro 'sem utilização de algemas e sem qualquer exposição midiática'
Por O Globo Sábado, 22 de Novembro de 2025
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro a pedido da Polícia Federal. No mandato de prisão preventiva, Moraes disse que a prisão deveria ser cumprida no início da manhã deste sábado "observando que a medida deverá ser cumprida com todo o respeito à dignidade do ex-presidente da República Jair Messias Bolsonaro, sem a utilização de algemas e sem qualquer exposição midiática".
Bolsonaro foi levado para a Superintendência da Polícia Federal (PF) em Brasília. A medida não se trata do cumprimento de pena por tentativa de golpe de Estado, mas de uma medida cautelar.
A PF alegou risco para a ordem pública ao pedir a prisão e citou a convocação feita pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) para uma vigília na noite deste sábado no condomínio onde Bolsonaro mora, em Brasília.
Moraes cita, no mandato de prisão que Bolsonaro foi condenado pelos crimes de liderar organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima, e deterioração de patrimônio tombado.
Trama golpista
No caso da trama golpista, a Primeira Turma da Corte o considerou culpado, por quatro votos a um, pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, abolição do Estado Democrático, organização criminosa, dano contra o patrimônio da União e deterioração do patrimônio tombado. Os ministros que votaram a favor foram Alexandre de Moraes, o relator do processo, Flávio Dino, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. Apenas o ministro Luiz Fux divergiu.
Além dele, foram condenados como integrantes do núcleo central da trama golpista os ex-ministros Braga Netto, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Anderson Torres; o ex-comandante da Marinha Almir Garnier; o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, que firmou acordo de delação premiada; e o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), que teve o processo suspenso pela Câmara até o fim do mandato quanto aos crimes de dano ao patrimônio e deterioração de patrimônio tombado.
O julgamento terminou em setembro, e os advogados recorreram. Após os recursos serem negados, o STF determinou o trânsito em julgado, fase que dá início ao cumprimento da pena,
Os ministros do Supremo que participaram do processo consideram que Bolsonaro foi o líder político e intelectual do grupo que planejou e colocou em prática planos para impedir a posse do presidente Lula.
A estratégia incluiu um plano que tinha como objetivo o assassinato do atual presidente, do seu vice, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes. Uma das principais provas que justificaram a condenação de Bolsonaro foi a elaboração de uma minuta de decreto com teor golpista, apresentada por Bolsonaro aos comandantes das Forças Armadas.
A elaboração e pressão sobre os comandantes foi confirmada pelo ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes, e pelo ex-comandante da Aeronáutica Carlos Baptista Junior.
Ambos relataram que, em reuniões no Palácio da Alvorada, Bolsonaro discutiu medidas como alternativas à derrota eleitoral, como estado de defesa e de sítio e operação de Garantia de Lei e da Ordem (GLO).
A discussão do documento foi confirmada por mensagens descobertas pela investigação. No dia 7 de novembro, o general da reserva Mario Fernandes, que era secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, enviou uma mensagem para o titular da pasta, Luiz Eduardo Ramos, relatando que "o decreto é real, foi despachado ontem com o presidente".
Depois, no dia 9 de dezembro de 2022, o tenente-coronel Mauro Cid, que era ajudante de ordens de Bolsonaro, enviou um áudio a Freire Gomes afirmando que Bolsonaro "enxugou" o decreto, em relação ao que tinha apresentado aos comandantes.
Freire Gomes e Baptista Junior também afirmaram que houve pressão à cúpula das Forças Armadas para aderir ao plano. Um dos mecanismos de pressão foi o documento chamado de “Carta ao Comandante do Exército de oficiais superiores da ativa do Exército Brasileiro”. Militares da ativa são proibidos de se manifestarem politicamente. Ainda houve ataques em redes sociais.
Os ministros da Primeira Turma também consideraram que Bolsonaro tinha conhecimento dos planos em curso contra Lula, Alckmin e Moraes. As medidas contra as autoridades estavam previstas no "Punhal Verde e Amarelo", elaborado por Mario Fernandes. O general da reserva imprimiu o documento no Palácio do Planalto e, em seguida, foi ao Alvorada.
As alegações foram fortalecidas ainda pelo acordo de colaboração premiada firmado entre Mauro Cid e a Polícia Federal (PF)
Defesa de Bolsonaro
Bolsonaro confirma que se reuniu com os comandantes das Forças Armadas para discutir alternativas ao resultado eleitoral de 2022, mas alega que apenas discutiu instrumentos previstos na Constituição, como o estado de defesa ou de sítio.
— Se nós fôssemos prosseguir no estado de sítio ou até mesmo de defesa, as medidas seriam outras. Na ponta da linha é que teriam outras instituições envolvidas. Agora, não tinha clima, não tinha oportunidade e não tínhamos uma base minimamente sólida para se fazer qualquer coisa. E repito, só foi conversado essas outras hipóteses constitucionais tendo em de vista o TSE ter fechado as portas para a gente com aquela multa lá — afirmou Bolsonaro ao STF, em junho, durante seu interrogatório.
Sua defesa alegou ao STF que as conversas não podem ser consideradas crimes e que poderiam ser classificadas, no limite, como "atos preparatórios", que não podem ser punidos, já que não houve a decretação de nenhuma medida.
Os advogados também afirmam que, em último caso, deve ser aplicada a tese da "desistência voluntária", que ocorre quando a pessoa desiste de cometer um crime no meio da execução. Nesse caso, a punição só ocorre pelos fatos praticados até lá.
Após a prisão, com o término da ação penal, a defesa o ex-presidente pode tentar utilizar a revisão criminal. Esse instrumento pode ser apresentado em três casos: quando surgirem novas provas, quando a sentença for contrária à lei ou à evidência dos autos ou quando for baseada em depoimentos ou documentos falsos.
Prisão domiciliar
Bolsonaro está em prisão domiciliar desde agosto, medida relacionada a uma investigação sobre a atuação de seu filho Eduardo Bolsonaro para coagir a Justiça por meio da articulação de sanções pelo governo de Donald Trump contra a economia brasileira e contra autoridades do Supremo Tribunal Federal e do governo federal. Eduardo foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e virou réu no STF.
A prisão domiciliar foi decretada após o descumprimento das medidas cautelares determinadas pela Corte no curso daquele processo, além da alegação, pela Polícia Federal, de risco de fuga.
Inicialmente, em julho, Alexandre de Moraes determinou que Bolsonaro deveria usar tornozeleira eletrônico e estava proibido de usar redes sociais e de sair de casa de noite e nos fins de semana. O ex-presidente também ficou impedido de conversar com Eduardo.
Pouco mais de duas semanas depois, o ministro determinou a prisão domiciliar, alegando que Bolsonaro "ignorou e desrespeitou" as obrigações impostas. A decisão ocorreu após o ex-presidente participar, por telefone, de duas manifestações em apoio à anistia para os envolvidos nos atos golpistas do 8 de janeiro. Registros dessas participações foram publicados por seus filhos em redes sociais, o que, para Moraes, foi uma tentativa de burlar a proibição de uso das plataformas