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'Uma quase dupla' não consegue ser nem quase engraçado

Por Jornal da Paraíba    Sexta-Feira, 20 de Julho de 2018


UMA QUASE DUPLA (Brasil, 2018, 90 min.)
Direção: Marcus Baldini
Elenco:  Tatá Werneck, Cauã Reymond, Ary França, Louise Cardoso
★★☆☆☆

 

De Corra que a polícia vem aí (1988) a Seven – os sete pecados capitais (1995): não são poucas as referências embutidas em Uma quase dupla (2018), comédia policial nacional que estreia nos cinemas da Paraíba nesta quinta-feira (19). É uma pena, entretanto, que o filme de Marcus Baldini não consiga aproveitar o que há de melhor no gênero e entregue um filme “bem-acabado”, mas nada engraçado.

A história se passa na cidade interiorana de Joinlândia, um pacato município que parece ter parado no tempo – os idosos conversam nas ruas, todo mundo se conhece pelo nome, não há registro de violência. E é justamente por isso que quando um homicídio abala a calmaria da cidade, a investigadora Keyla (Tatá Werneck) é chamada do Rio de Janeiro para ajudar a diminuta força de segurança de Joinlândia, composta basicamente por Claudio (Cauã Reymond).

Keyla e Claudio incorporam os tipos clássicos dos filmes do gênero de Hollywood, bebendo em fontes como Chumbo grosso (2007) e a série Loucademia de Polícia (1984-1994). Keyla é a hipérbole do bad cop: a durona, destemida, não-estou-nem-aí-pras-regras que atira e grita enlouquecidamente à primeira vista de um suspeito (e, aqui, pontos para o filme por ter dado essa parte a uma mulher). Claudio, por sua vez, é o policial bonzinho, gentil e inexperiente, que nunca sequer atirou em alguém e fica nervoso ao chegar perto de um cadáver.

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Tatá e Cauã incorporam seus personagens com competência e têm química entre si, desenvolvendo o relacionamento dos protagonistas com naturalidade. O caminho que os dois vão percorrer – do estranhamento e repulsa inicial à ajuda mútua durante a resolução do caso até, por fim, um certo carinho mal-disfarçado que um acaba nutrindo pelo outro – não é novidade para ninguém; mas a proposta de Uma quase dupla jamais foi de ser original e os protagonistas são suficientemente carismáticos.

Para além da (quase) dupla, as escolhas do diretor Marcus Baldini e de sua equipe também são interessantes. A cidade parada no tempo, embora situada nos dias atuais, é retratada de forma inteligente na tela com veículos, figurinos e acessórios que parecem ter saído direto dos anos 80; a trilha sonora, composta principalmente por músicas dos anos 80 e 90 (para além da recorrente Shimbalaiê), evoca semelhante nostalgia. O longa se utiliza, ainda, de recursos audiovisuais típicos das comédias dos anos 80 (closes rápidos e inesperados, efeitos de som que reforçam os sentidos da imagem etc.). Os efeitos de maquiagem, por sua vez, também são bem convincentes enquanto paródia das clássicas cenas nauseantes de Seven.

Uma quase dupla, portanto, é uma obra construída com competência, que consciente e propositadamente bebe da fonte de outros inúmeros filmes do gênero (“serial killer é coisa de cinema!”, grita o delegado Moacir, vivido por Ary França, ao ouvir o termo). Para além do elenco e dos aspectos formais, entretanto, existe um problema elementar nesta comédia policial: ela não é engraçada.

uma quase dupla

Humor do filme recai sobre os ombros de Werneck.

Tatá Werneck até tem seus momentos, e suas caras, bocas e maneirismos (vide as tentativas recorrentes de acender o cigarro) ao encarnar uma policial durona rendem algumas risadas. Mas ela não pode carregar todo o humor do filme nas costas, e é aí que a roupagem de Uma quase dupladesmorona para revelar uma obra tão oca quanto as motivações de seu assassino.

Cauã Reymond é competente, mas não consegue ser engraçado. Seu ingênuo Claudio soa mais mimado, carente e lerdo do que genuinamente cômico: alguém que você tentaria proteger dos males do mundo, mas não pediria jamais para contar uma piada.

O roteiro traz algumas gags de fato engraçadas – como o momento em que Claudio interrompe uma perseguição para cumprimentar uma velhinha e receber sua bênção -, mas elas são raras. A comédia física dificilmente funciona, e o filme chega a exagerar em quedas, rodopios e acidentes que são apenas teatrais e ineficientes.

Os momentos em que o texto tenta assumir um tom mais sério – basicamente ao tentar explorar os passados de Keyla e a relação de Claudio com a mãe – revelam uma inépcia do roteiro em imprimir algum grau de verossimilhança às suas personagens, que são reduzidas a meros estereótipos.

Se, com a exceção de Keyla, as personagens não são engraçadas e nem minimamente críveis; se o filme precisa recorrer com frequência a recursos como tropeços, batidas e gestos teatrais para tentar produzir algum humor; se as personagens não suscitam uma mínima empatia, fica difícil se identificar com alguma coisa. Uma pena, pois percebe-se o grau de cuidado e carinho dos envolvidos na produção de Uma quase dupla. Mas tudo que o filme consegue ser, apesar disso, é uma quase comédia.

 

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