Por Vicente Conserva Sexta-Feira, 30 de Março de 2018
A primeira parte de “Nada a Perder”, cinebiografia sobre o bispo Edir Macedo, ganhou o subtítulo “Contra Tudo. Por Todos”. A frase resume bem a que se propõe o longa de duas horas e quinze minutos.
A narrativa começa lenta, tentando ressaltar o caráter, a determinação e, sobretudo, a fé do protagonista. Como se trata de uma obra inspirada em fatos reais, o expectador poderá reconhecer nas telas alguns episódios que assistiu nos noticiários algumas décadas atrás.
A ascensão de Edir Macedo (vivido por Petrônio Gontijo), um menino da família pobre, vindo do interior do Rio de Janeiro, e se tornou conhecido em muitos lugares do mundo deve-se ao tripé: prosperidade, curas e libertação. Essa é a base de sustentação da Igreja Universal do Reino de Deus, e que se vê claramente nas telas.
De um pregador desacreditado num coreto da cidade até o homem que chegou a lotar o Maracanã e o Maracanãzinho ao mesmo tempo para uma “concentração de fé”, a história é longa e cheia de percalços.
Macedo aparece dizendo que seu único propósito era pregar o evangelho e ganhar almas para Deus pelo mundo. Contudo, o filme tem menos sermões que se podia imaginar. Elementos básicos da doutrina cristã, como arrependimento de pecados, a necessidade de novo nascimento são ignorados, dando espaço para a necessidade de fé e “acreditar em si mesmo”.
As dificuldades pessoais vividas pela família de Macedo, ao lado da esposa Ester (Day Mesquita), são superadas sempre com essa fé em Deus e na sua própria capacidade. Chama a atenção a maneira como ele é contrastado com os outros líderes religiosos com quem ele chegou a trabalhar – Bispo Roberto McAlister e R. R. Soares – que nunca acreditaram em seu potencial.
Também são líderes religiosos (católicos) os vilões da história, que tentam impedir o crescimento da Universal, classificada por eles de “seita” o tempo todo. A compra da TV Record e a sua prisão em 1992, ocupam boa parte da narrativa, justificando o “contra tudo”.
A vida do protagonista é contada em três atos: infância, juventude e conversão e estabelecimento da IURD. As acusações de charlatanismo e a perseguição religiosa que Macedo foi vítima nas décadas de 1980 e 1990 parecem deslocados no Brasil de hoje, cada vez mais pentecostal. Mas servem como uma breve lição de história sobre o tempo em que para ser evangélico no Brasil era necessário coragem.
A direção de Alexandre Avancini remete a “Nada a Perder” uma linguagem excessivamente televisiva. A edição e a dinâmica de alguns diálogos remetem a muitos folhetins bíblicos da Record, especialmente Apocalipse. Assim como na novela, existe um embate religioso e político constante, que afeta diretamente a vida das pessoas.
A atuação de Petrônio Gontijo é convincente, mas a dos demais obreiros e pastores, como R. R. Soares (André Gonçalves) soam um tanto inverossímeis para quem possui uma vivência em igrejas evangélicas.
O longa-metragem é uma boa produção para quem gosta de histórias de superação e filmes que reforcem os valores cristãos. Há de se lamentar, contudo, que perca uma grande oportunidade de apresentar o evangelho de forma clara, pois ao mesmo tempo que critica a representação católica de um “Cristo morto”, pouco tem a dizer sobre o “Cristo vivo” que prega o protagonista.